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30/06/2010 - Hepatite: A perigosa inflamação do fígado

O fígado humano é como um laboratório, capaz de transformar, criar e destruir elementos. Ali, quimicamente, substâncias ganham novas funções e toxinas são eliminadas. Mas esse aparelho eficiente e dinâmico também corre riscos que podem comprometer suas funções. A hepatite, doença inflamatória do fígado, pode causar graves prejuízos ao órgão, e o que é mais alarmante, fazer isso de forma silenciosa, sem que a pessoa infectada perceba o mal pelo qual está passando.

Vários fatores podem desencadear a hepatite, que tem diferentes classificações. Ela pode ser viral (quando for causada por um vírus, identificados nos tipos A, B, C, D e E), autoimune (quando o sistema imunológico reconhece seus próprios tecidos como estranhos, atacando-os para destruí-los) ou ainda ser causada por reação ao álcool, drogas ou medicamentos, já que é no fígado que essas substâncias são transformadas.

Entre as hepatites existentes, a mais comum no mundo todo é a do tipo A. Ela é verificada com maior frequência em países em desenvolvimento, que não contam com saneamento básico adequado. Essa versão da doença é transmitida por via fecal-oral, de uma pessoa para outra ou através de alimentos ou água contaminada. “Tanto é que no Brasil, parte da população já teve contato com o vírus da hepatite A e não sabe que foi contaminada”, comenta o gastroenterologista e hepatologista Antonio César de Azevedo Pedro, que atua no corpo clínico da Santa Casa de Araçatuba.

Nos Estados Unidos e Canadá existe vacinação efetiva contra hepatite A. No Brasil, a vacina não está no calendário oficial de vacinação da rede pública. É aplicada apenas em casos especiais, como em pacientes com doenças imunodepressivas, após solicitação à Secretaria de Saúde Estadual.

A hepatite do tipo A é autolimitada, ou seja, a pessoa elimina o vírus sem perceber a contaminação e, geralmente, não há complicações. O vírus A produz uma inflamação aguda do fígado, nunca crônica. Assim, o paciente pode ficar doente por alguns dias ou semanas, mas uma vez que melhora, a infecção acaba e não há destruição progressiva do fígado. “A mortalidade por hepatite A é muito baixa”, frisa o César Pedro. Algumas pessoas, a minoria, podem ter febre, dores musculares, cansaço, mal-estar, inapetência, náuseas e vômitos. Após alguns dias, pode aparecer icterícia (pele amarelada), colúria (urina escurecida) e acolia fecal (fezes esbranquiçadas).

Quando a pessoa é contaminada pelo vírus B, a hepatite pode causar doença crônica – se adquirida na fase adulta, em 10% dos casos, e na infância em 90% dos casos. Neste caso, a vacinação é obrigatória no Brasil e, atualmente, as crianças são vacinada nas primeiras 12 horas de vida.

O contato íntimo com um portador do vírus é a principal via de contaminação. A transmissão é causada, principalmente, por meio da relação sexual, contato com secreções, no contato com objetos contaminados (como alicates, lâminas, materiais utilizados em tratamentos dentários e cirurgias). O médico alerta que entre 20% e 30% dos casos não é identificado como a pessoa foi contaminada. “A imunização é fundamental como medida preventiva”, frisa. No Brasil, a maior incidência da hepatite B é na região Amazônica, devido à dificuldade na vacinação da população local.

Em Araçatuba, a vacinação de recém-nascidos contra a hepatite B teve início antes de ser oficializado o protocolo deste tipo de imunização em todo o Brasil, o que ocorreu há cerca de 12 anos. “Foi uma boa repercussão na época, e ajudou a disseminar a ideia de que a prevenção é essencial; a rede de saúde da cidade, junto à Secretaria de Saúde, conseguiu implantar uma medida que, com o tempo, seria comprovadamente eficaz”, lembra o médico.

César Pedro explica que somente aqueles que possuem o vírus B podem ser infectados também pelo vírus D. Em ambos os casos, os principais sintomas na fase aguda são febre, dor nas articulações, náuseas, mal-estar, dor de cabeça. Em 20% ou 30% dos casos pode surgir icterícia e colúria, o que facilita o diagnóstico

Contudo, a mais temida entre as hepatites virais é a do tipo C, que, na maioria dos casos, 90%, evolui para uma infecção crônica.  Grande parte portadores só percebe que está doente anos após a infecção, quando apresenta um caso grave de hepatite crônica, cirrose (20% dos casos) e câncer no fígado (10%).

Segundo o especialista, entre 1,5% a 2% da população brasileira tem o vírus da hepatite C. “Os costumes atuais ainda são propícios para a proliferação do vírus, principalmente, o tipo C”, alerta o médico.

O uso de utensílios coletivos é considerado um dos principais fatores para a proliferação da doença. A utilização de lâminas e alicates para unhas, por exemplo, são exemplos de materiais que podem contaminar toda a família.
Por ter sido identificada há apenas 20 anos (o primeiro diagnóstico registrado como hepatite C foi realizado em 1989) a doença pode ter infectado muitas pessoas que até então não imaginavam que hábitos comuns pudessem provocar complicações à saúde.

Devem estar atentos quanto à contaminação pessoas que passaram por transfusão de sangue ou cirurgias antes da década de 1990, usuários de drogas, pessoas que fizeram tatuagens, colocaram piercing, aqueles que realizaram tratamento dentário, clientes de manicures e pedicuras, e, principalmente, as pessoas que utilizaram seringas de vidro ou agulhas não descartáveis.

“Alguns hábitos antigos, como o uso coletivo de navalhas de barbeiros, por exemplo, foram responsáveis por contágios há anos; muitas pessoas descobrem a doença hoje e se questionam sobre atitudes atuais, contudo, o contágio pode ter ocorrido há muito tempo”, diz César Pedro. Esse é um dos principais motivos que incluem homens com idade entre 30 e 49 anos no grupo de risco para hepatite C.

Para descobrir se já teve contato com algum dos vírus da hepatite a pessoa deve realizar três exames: o HBsAg, o anti-HBC e o anti-HCV. “Trata-se de exames de sangue que podem ser solicitados em qualquer check-up; é preciso saber se houve contato com um dos vírus para iniciar o tratamento mais adequado, se necessário.”

Um hemograma (exame que avalia as células sanguíneas de um paciente, as séries branca e vermelha, contagem de plaquetas) com alterações pode apresentar índices anormais, alertando para uma doença hepática. De qualquer forma, a realização dos exames HBsAg, o anti-HBC e o anti-HCV é indispensável.

O médico lembra que ainda não existe vacina para Hepatite C. Cerca de 90% das pessoas que adquirem o vírus C permanecem com a doença, de uma maneira crônica (que pode evoluir para uma cirrose, câncer de fígado ou necessidade de transplante) até o fim da vida. Ele é a principal causa de indicações de transplantes de fígado e cirrose hepática (doenças no fígado que alteram as funções das suas células e dos sistemas de canais biliares). Entre 5% e 10% dos pacientes destes casos, desenvolvem câncer de fígado.


“Por isso que a prevenção deve ser constante e as pessoas devem estar conscientes sobre as formas de contágio”, frisa. Ele lembra que todo quadro de hepatite pode levar à insuficiência hepática, exigir transplante de fígado ou levar o paciente à morte. “Cada caso é muito particular e, normalmente, as complicações são mais comuns com a contaminação por hepatite C”. Os outros vírus D, E, F e G, são mais raros.

Ambulatório e grupo de apoio
Para lidar com os efeitos da doença, que causa transformações na vida do portador e da sua família, ações das entidades de saúde e da sociedade civil são desenvolvidas em prol àqueles que convivem com a Hepatite.
Em Araçatuba, o Ambulatório de Hepatites Virais, que funciona no Centro de Saúde Aristides Troncoso Peres, mais conhecido como Postão, na Vila Mendonça, promove o acompanhamento dos pacientes, além de prestar esclarecimentos à população em geral.
No ambulatório são realizados os exames HBsAg, o anti-HBC e o anti-HCV, provas de funções do fígado, solicitações de ultrassom e biópsias hepáticas, coletas para biópsias hepáticas, avaliações sobre o estado de saúde geral dos portadores da doença e rastreamento (verificação do contato do paciente com terceiros, como familiares, indivíduos para os quais possa ter transmitido o vírus; essas pessoas precisarão passar por exames e acompanhamento médico).
O programa, que está em funcionamento há mais de 15 anos, também é o responsável pela aplicação dos medicamentos distribuídos àqueles que estão em tratamento. Atualmente, o ambulatório conta com os seguintes especialistas em hepatologia:  Antonio César de Azevedo Pedro e Ricardo Protte Pedro.
Encontros
Um grupo de apoio formado por portadores de hepatite e seus familiares promove reuniões mensais para troca de experiências. “A intenção é que os pacientes que estão a mais tempo em tratamento auxiliem aqueles que estão iniciando, dando incentivo”, comenta o gastroenterologista e hepatologista Antonio César de Azevedo Pedro.
No ano passado, as reuniões aconteciam no consultório do médico e contavam com participação de um profissional da área da Psicologia. O grupo está organizando a agenda para as atividades deste ano, mas os interessados em conhecer e participar dos encontros podem obter informações por meio do telefone (18) 3622-3895, no ambulatório, ou no 3623-4557.

Tratamento
Os cuidados para conter e tratar as hepatites são complexos e os resultados são muito individuais. Enquanto alguns indivíduos respondem bem ao tratamento, tendo efeitos colaterais, mas neutralizando o vírus, outros podem ter os mesmos efeitos colaterais, mas não consegue negativá-lo.  Os efeitos colaterais mais comuns são semelhantes aos causados pelo vírus da gripe (dores pelo corpo, febre, mal-estar), porém podem ocorrer alterações no sistema imunológico, inclusive levando ao desenvolvimento de diabetes ou doença da tireoide.

“Uma biópsia detalhada irá determinar quem precisa tomar medicamentos e quem deve aguardar a evolução do quadro”, comenta César Pedro. “É uma decisão delicada e muitos pacientes não compreendem que, muitas vezes, em lesões hepáticas leves a indicação é não tratar com medicamentos, pois não há droga eficiente para erradicar a doença em sua totalidade”, explica. “A pessoa terá os efeitos colaterais, mas não estará eliminando a doença.”

Contudo, o acompanhamento daqueles que apresentaram exame positivo para a doença deve ser constante. As consultas devem ocorrer a cada seis meses. A família e pessoas que têm contato com o portador também realizar os exames para saber se foram infectadas.

Situações de risco
Saiba mais sobre as hepatites mais comuns, suas formas de transmissão e cuidados com a saúde:

Vírus A
Transmitido por via fecal-oral, de uma pessoa para outra ou por alimentos ou água contaminada – assim como o vírus E. Ocorre com maior incidência em locais com saneamento básico inadequado. Quando a pessoa é infectada desenvolve imunidade contra esse vírus por toda a vida. Pode ser assintomática ou sintomática, quando a pessoa sente sintomas de uma virose comum.

Vírus B
Pode ser transmitida por via parenteral e perinatal (durante a gestação e o parto), transmissão sanguínea e sexual (transfusão com sangue contaminado, compartilhar agulhas e seringas com sangue contaminado, vários parceiros sexuais e uso de instrumentos dentários, manicure/pedicura, instrumentos de tatuagem e piercing contaminados, uso comum de navalhas, lâminas, aparelhos de barbear e escova de dente). O vírus pode ser eliminado naturalmente do organismo ou causar uma doença inflamatória crônica. Os sintomas demoram de um a quatro meses para aparecer após a infecção. Os principais sintomas na fase aguda são febre, dor nas articulações, náuseas, mal-estar, dor de cabeça, há casos de icterícia e colúria. Só pega o Vírus D quem já tem a hepatite B.

Vírus C
Transmitido principalmente pelo sangue contaminado e compartilhamento de agulhas por usuários de drogas. Pode ser transmitido pelas vias sexual e vertical (de mãe para filho). O portador pode desenvolver uma forma crônica da doença que leva a lesões no fígado (cirrose) e câncer hepático. É assintomática na maioria dos casos, mas o portador também pode sentir mal-estar, vômitos, náuseas, apresentar icterícia, dores musculares.

Medidas preventivas
• Tome a vacina contra hepatite B;
. Use preservativo; a relação sexual é a principal via de transmissão da hepatite B;
• Certifique-se de que os instrumentos usados para fazer as unhas foram esterilizados ou leve consigo os que vai usar;
• Ao ter contato com sangue contaminado, procure um médico imediatamente;
• Ao engravidar (ou se já estiver grávida), faça o teste para saber se é portadora do vírus da hepatite B e C;
• Não coma frutos do mar crus ou mal cozidos. Ostras que se comem cruas e mariscos são transmissores importantes do vírus da hepatite A;
• Beba água clorada ou fervida;
• Lave as mãos antes das refeições e depois de usar o banheiro;
. Não utilize drogas, principalmente, injetáveis.

 

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